quarta-feira, 28 de maio de 2008

Uma luta fundamental

Alvaro Acioli

Virgem da Piedade deu à luz o nosso deus, Téete Mañuco. Ele aniquilou a humanidade antiga, fazendo cair sobre ela uma chuva de fogo. Depois criou o homem atual. E dividiu a humanidade em duas categorias: os índios e os Mistis (A palavra Misti designa não apenas os brancos, mas todos os que pertencem à classe dominante). Os Mistis tinham, e ainda têm o direito de fazer os índios trabalhar, chicoteando-os, se preciso. Os Mistis não são obrigados a trabalhar.
A divisão social instituída por Téete Mañuco será eterna; porque esse deus não pode perecer; todos os anos morre, numa sexta-feira, e ressuscita no sábado. Mas ele também fez o inferno e o céu. Todos vão para o inferno antes de irem para o céu. Vai-se para o inferno porque não há ser humano isento de pecado. Depois se vai para o céu. O céu é exatamente semelhante à terra. Mas, no céu, os que foram índios na terra transformam-se em Mistis e obrigam a trabalhar aqueles que eram seus amos, açoitando-os, se preciso. (Versão livre de texto recolhido em quíchua, na província de Carhuaz, Peru.)
Um dia, Confúcio foi passear até ao alto da porta da cidade e suspirou tristemente. Seu discípulo Yen Yen, que se achava a seu lado, perguntou-lhe:
- Por que suspira o Mestre?
Confúcio respondeu: Jamais chegarei a conhecer verdadeiramente o uso do Grande Caminho e os homens ilustres das Três Dinastias. E, no entanto, eles inspiram minha ambição. Quando o Grande Caminho era usado, todos tinham parte igual no mundo. Os cargos eram dados conforme o mérito e a competência, e os homens viviam na retidão e no afeto. Também não consideravam seus próprios pais como seus únicos pais, e seus próprios filhos como seus únicos filhos. As pessoas idosas terminavam tranquilamente seus dias e os homens robustos encontravam o trabalho que lhes convinha; os jovens recebiam educação e cuidava-se das viúvas e viúvos, dos órfãos e dos doentes. Os homens tinham suas ocupações e as mulheres o seu lar. Tinham horror ao desperdício e ainda assim não acumulavam bens para si próprios; repugnava-lhes a idéia de que sua energia não fosse plenamente empregada. E, não obstante, não a utilizavam para fins exclusivamente pessoais. Não podia haver, portanto, conspirações, nem ladrões, nem rebeldes, de modo que era inútil aferrolhar as portas. Era a época da Grande Unidade. (Versão de um texto de Li Ki, século II a.C. China).

A tarefa própria do gênero humano, tomado em sua totalidade, é atualizar continuamente a plenitude do poder do intelecto possível, primeiro tendo em vista a especulação, depois, como conseqüência, pela prática. Ora, as partes e o todo obedecem às mesmas leis; se o indivíduo adquire prudência e sabedoria vivendo pacífica e tranquilamente, o gênero humano, de modo análogo, se consagra muito livremente e de maneira muito fácil à sua tarefa própria, quando goza do repouso e da paz; a sua tarefa é quase divina, segundo a palavra santa: tu o colocaste pouco abaixo dos anjos. Donde se segue que a paz universal é o melhor de todos os meios que nos podem proporcionar a felicidade. (Tópicos extraídos de um texto de Dante De monarchia, 1308).

O fim de uma lei não é absolutamente abolir ou diminuir a liberdade, mas conservá-la e aumentá-la. Com efeito, em todos os Estados cujos membros são criaturas capazes de terem leis, onde não houver lei alguma não haverá também liberdade alguma. Pois a liberdade consiste em estar-se isento de constrangimento e de violência da parte de outrem; o que se poderia encontrar onde não houvesse lei, e onde não há, conforme dissemos acima, uma liberdade graças à qual cada um pode fazer o que lhe agrada. Pois, quem pode ser livre quando o humor ressentido de outro homem qualquer puder impor-se sobre ele e dominá-lo? (John Locke, Inglaterra. Segundo ensaio sobre o governo civil. 1690).

As poucas citações transcritas visam realçar a dimensão histórica da longa travessia humana. Mas uma grande distância ainda nos separa da consagração desses objetivos. Uma distância traduzida pela existência de 1,3 bilhões de miseráveis; pela morte diária de 35 mil crianças, por causa de epidemias ou subnutrição; por 850 milhões de pessoas sem acesso a uma ração alimentar básica; por uma globalização econômica que torna os países ricos cada vez mais poderosos e os estados pobres cada vez mais dependentes.
Em 1948, no Palácio de Chaillot, em Paris, foi proclamada uma Declaração que dava uma repercussão universal a essa luta por direitos que os povos de todas as culturas travam desde sempre.
Uma luta que em pleno terceiro milênio ainda está muito longe de realizar o seu objetivo principal: fazer do homem o centro de referência da sociedade dita humana.
Talvez isso só se torne possível quando a educação humana se fundar no ensino de seus direitos elementares.

domingo, 18 de maio de 2008

Prazer e Realidade

Alvaro Acioli
O inconsciente coletivo da sociedade está impregnado por idéias relacionadas a um consumismo compulsivo. É justamente essa espécie de "doença" que orienta o marketing impiedoso que está sendo aplicado, em todo o mundo, a tudo que é ou pode vir a tornar-se objeto de desejo ou produto para consumo.
Trata-se mais propriamente de uma verdadeira epidemia. Certamente a epidemia mais contagiosa, de todos os tempos, contra a qual não existe qualquer tipo de remédio eficaz ou vacina capaz de promover alguma imunidade preventiva. Sabe-se, apenas, graças a estudos e pesquisas realizados, que a virulência dessa onda epidêmica é diretamente proporcional ao volume de ilusões perdidas ou à quantidade de prazer reprimido, por indivíduos e sociedades.
Um imenso hipermercado. É isto que parece ou no que se transformou esse mundo interligado que habitamos, a terra do momento global.
A capacidade de consumir é o que estabelece agora o estágio de desenvolvimento dos países e o grau de cidadania das pessoas. Mas a variedade infinita de itens, que sobram nas prateleiras, desse hipermercado, tem um custo proibitivo para a grande maioria.
Entre os milhões de produtos, que lideram suas vendas, apenas dois estão ao alcance de todos e podem ser fartamente consumidos: os medos de todos os tipos e uma imensa variedade de ilusões, das mais simples às mais deslumbrantes.
Felizmente o inconsciente coletivo foi "preparado" historicamente para esse instante. Ele está hoje, mais do que nunca, completamente erotizado pelas experiências mais arcaicas de prazer e pela tentação compulsiva de produzi-las. Também está, além disso, povoado por recordações alegres, do tempo em que o imaginário, de todos os homens, girava em torno da satisfação de seus instintos e de suas pulsões mais secretas.
Não importa que as dificuldades se acentuem no grande mercado social. E que uns morram de fome enquanto outros morrem de comer. E também que aumente, constantemente, o privilégio dos mais ricos e as desventuras dos mais pobres.
É possível observar, por todos os lados, tentativas frenéticas de escapar das forças repressoras e dos autoritarismos: ora transgredindo, ora enganando ou até mesmo deixando-se aparentemente escravizar, por tarefas ou obrigações repudiadas intimamente. Um objetivo negado dos estadistas continua sendo alcançar o poder, obter mais privilégios, para viver, ainda que de uma forma fugaz, o prazer irresponsável dos absolutamente descompromissados.
Esse confronto entre opostos faz parte de uma força dinâmica intrínseca à sociedade humana, cuja selvageria lúdica se denuncia através dos conflitos renovados entre raças, credos e ideologias. Apesar de todos os pesares o consumo do prazer continua livre no universo mental da maioria, que busca ou tenta reviver a experiência paradisíaca dos tempos de Adão e Eva. A luta entre Dionísio e Prometeu, entre prazer e realidade, vai perdurar por todos os tempos e sobreviverá a todos os saberes.

sábado, 17 de maio de 2008

A dama da esperança

Manoel Fernandes Neto
"Histórias muito melosas
não tocarão as pessoas."
A missão de Judy Rodgers é louvável. A comunicadora tem um compromisso com a esperança e com o otimismo na conscientização dos meios de comunicação de massa, campanhas publicitárias e mensagens que são despejadas, diariamente, em busca de leitores e consumidores. O desafio é colossal; mas o caminho escolhido por ela agiganta-se com a organização de conversações proativas com produtores de conteúdo e diretores de empresas de comunicação.
Judy é criadora e coordenadora do projeto Images and Voices of Hope.
NovaE.inf.br - Como cobrir um fato como o recente acidente aéreo ocorrido no Brasil com um avião da empresa TAM, que vitimou 200 pessoas, e que em si nos traz uma avalanche de imagens negativas e desdobramentos políticos? Como manter a voz da esperança?
Judy Rodgers - Em tragédias como a do acidente da TAM, é claro que há imensa tristeza e pesar, e com certeza é preciso entender as causas. Porém, em muitas tragédias existem histórias de heróis que rapidamente aparecem para ajudar - em terremotos, inundações e acidentes onde não há morte instantânea para todos os envolvidos. Pode ser muito inspirador para as sociedades ouvir as histórias de heroísmo e grandeza, bem como os fatos da tragédia.
NovaE.inf.br - O pacifista e escritor israelense Amós Oz diz, em seu livro "How to Cure a Fanatic", de 2002, que o contrário da guerra não é o amor, não é a compaixão, não é a generosidade ou a fraternidade. O contrário da guerra, diz ele, é a Paz. Como esta visão racional pode ser sugerida aos dirigentes dos meios de comunicação de massa, quando estes constroem uma mídia extremamente emocional, para o bem e para o mal, visando unicamente aumentar a audiência e criar um véu invisível de alienação no público?
Judy Rodgers - O erro que cometem muitos dos tomadores de decisão na mídia é o pensamento de que as únicas emoções que atraem o público são as de medo, tristeza e raiva. Existem outras emoções, como admiração, respeito, gratidão, alegria, grandeza, amor, generosidade, etc. Elas são extremamente interessantes para as pessoas, quando as histórias são bem escritas. Às vezes nós, que somos da mídia, nos esquecemos de que as histórias devem ser fortes e bem escritas – histórias muito "melosas" não tocarão as pessoas. Mas histórias bem escritas, que envolvem as emoções positivas das pessoas, podem ser muito poderosas. NovaE.inf.br - Estudiosos da mídia e grupos de discussão na Internet apontam um fundamentalismo midiático do mundo, que seguem a doutrina estadunidense de defesa intransigente de "valores ocidentais" baseada em três pilares: enaltecer o consumo, desprezar atitudes em defesa do Planeta e comemorar uma cultura hedonista acima de valores espirituais. Já existem exemplos que contrariem esta realidade?
Judy Rodgers - Eu acho que ajuda pegarmos esses “três pilares”, individualmente. Com relação a enaltecer o consumo, podemos começar aqui com as empresas e agências de propaganda. Um bom exemplo é a mudança que a Unilever da Holanda fez recentemente, com sua campanha do Dove, “Beleza Verdadeira”, para o sabonete Dove. Esta campanha, que de fato vende sabonete, tem focado nos 5 últimos anos, ou algo em torno disso, em novas imagens de beleza – além de mulheres bonitas e magras.
Agora, a Unilever foi além, com sua nova campanha sobre “Beleza Interior”, na qual eles visam chamar a atenção para o problema de distúrbios alimentares nas mulheres. Outro lugar em que podemos encontrar exemplos é a McCann Erickson, Chile. O diretor-geral, Pablo Walker, e a vice-presidente de planejamento, Maribel Vidal, tomaram uma verdadeira liderança na mudança dos princípios da propaganda com relação a enaltecer o consumo. Quanto a desprezar as atitudes em defesa do Planeta, isto simplesmente não é mais verdade. Foi até dois anos atrás, mas agora há muitos exemplos na mídia liderando o caminho na defesa do Planeta. Há muitos para mencionar aqui, na verdade. Há, agora, o famoso filme de Al Gore sobre “Uma verdade inconveniente”; existem revistas como a Yes! www.yesmagazine.org
; Ode www.odemagazine.net ; e GreenBiz www.greenbiz.com . Há séries de TV, como Mercado Ético, sendo produzidas no Brasil por Christina Carvalho Pinto, etc. Há também muitas fontes de mídia que enfatizam os valores espirituais – especialmente na Holanda e nos Estados Unidos. NovaE.inf.br - No Brasil, poucas famílias detêm o monopólio de comunicação. Como convencer tais interesses sobre a importância de atitudes que despertem a formação do Ser Integral e esclarecido, quando o que está em jogo, para esses empresários, é o poder político e o aumento da receita publicitária, ficando em um plano bem secundário intenções dignas como o do IVE?
Judy Rodgers
- O Imagens e Vozes de Esperança nunca se opôs ao fato de os negócios da mídia terem lucro. Todos nós, que trabalhamos na mídia há anos, entendemos que essas não são (para a maioria) transações filantrópicas. Nós também achamos que aqueles que possuem negócios de mídia têm as mesmas esperanças e sonhos para suas famílias e para o Planeta, como todos têm. É por isso que usamos o diálogo como um método de entrosamento quanto à melhor forma de prosseguir.

http://aaciolitravessia.blogspot.com/2008/05/imagens-e-vozes-da-esperana.html
Manoel Fernandes Neto é jornalista e editor da revista NovaE
( http://www.novae.inf.br/ )


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