Consiste no fato singular de comparecermos como seres de socialidade, de cooperação e de convivialidade. Tal singularidade aparece melhor quando nos comparamos com os símios mais próximos como os chimpanzés. Em termos genéticos nos diferenciamos deles apenas por 1,6%. Eles também possuem vida societária. Mas se orientam pela lógica da dominação, da hierarquização e do assujeitamento do outro. Por isso as relações se apresentam pouco cooperativas e de dominação.
Ao surgir o ser humano, rompe-se essa lógica. Não sabemos exatamente a data, mas seguramente por volta de três milhões de anos atrás. Ao invés da competitividade e da subjugação entra a funcionar a cooperação. Concretamente, nossos ancestrais humanóides saiam para caçar, traziam os alimentos, e os repartiam socialmente entre eles. Não faziam como os outros primatas superiores que comem cada um para si. Aqueles 1,6% de ácidos nucléicos e de bases fosfatadas próprias, fundam o humano enquanto humano, como ser de cooperação. Esses laços de solidariedade fizeram surgir também o enternecimento e a relação de cuidado de um para com um do outro. Foi essa relação que serviu de ambiente para o aparecimento da linguagem na qual reside a essência humana.
Essa interpretação da antropogênese é recorrente em grandes nomes das ciências da vida como os conhecidos cientistas chilenos Humberto Maturana e Francisco Varela ou Frijhof Capra, Christian de Duve e outros. Humberto Maturana resume tudo dizendo:"O que nos faz seres humanos é nossa maneira particular de viver juntos como seres sociais na linguagem".
A cooperação impede a excessiva acumulação de um lado e o empobrecimento do outro. Ocorre que vige hoje um sistema social que se organiza não na troca cooperativa mas na troca competitiva na qual só o mais forte ganha. É o capitalismo, como modo de produção e como cultura, que representa a sobrevivência da política do chimpanzé em nós, no dizer de Humberto Maturana, vale dizer, daquela carga genética que temos em comum com os chimpanzés, parte que ainda não inaugurou o reino do humano com sua força socializadora e cooperativa. Por isso, esse sistema é individualista e excludente. Reafirma e magnífica o individuo e o eu à custa do nós. É essa lógica que permite a perversidade de 50 milhões de famintos e excluidos em nosso país, ao lado de 400 mil famílias de abastados.
Eis uma boa razão para querermos a revolução, para superarmos essa barbárie, para podermos ser mais humanos, mais seres de linguagem comunicativa, de relação e de solidariedade irrestrita.
Neste sentido, estamos ainda na ante-sala de nossa verdadeira humanidade. Dois terços dos humanos vivem em níveis de crueldade e sem piedade, vítimas da voracidade acumuladora da lógica-chimpanzé. A revolução necessária será por razões éticas e de com-paixão com nossos co-iguais. Com eles queremos repartir o pão, ser companheiros (cum panis) e companheiras na aventura planetária.
http://www.rbc.org.br/feijao/polichimpa.htm