sexta-feira, 3 de abril de 2009
Utopia particular
Alvaro Acioli
A insegurança e a incerteza são condições inseparáveis da existência humana. E o homem expressa essas vivências básicas através do medo de perder tudo aquilo que adquiriu com muito esforço, suor e lágrimas.Tudo no sentido exato da palavra : os avanços científicos e tecnológicos realizados, nas diversos campos do conhecimento . E até mesmo a própria civilização que ele criou.Felizmente a canoa do homem, embora frágil, nunca afundou completamente, não foi jamais literalmente a pique. Existiram sempre meios de reparar os estragos ocorridos e os náufragos, nadando um pouco e com muita sorte, conseguiam se salvar. Mas na longa trajetória humana são incontáveis
as quedas e os retrocessos ocorridos . Os furacões modernos, todavia, ameaçam mais perigosamente a frágil canoa, já muito remendada.Dos acidentes anteriores o homem conseguiu livrar-se e prosseguir navegando. O risco atual é o de que a viagem seja definitivamente interrompida, agora por dificuldades com o próprio navegante.As descobertas tornaram-se diárias e sustentam um círculo de inovações sem precedentes. Mas esse progresso vertiginoso está aumentando, de forma dramática, a desorientação humana ; quanto mais mistérios decifrados mais dúvidas aparecem. O avanço científico acabou com todas as certezas que existiam e hoje o homem duvida de sua própria condição humana.A saída é capaz de estar exatamente aí : ser homem é talvez viver a possibilidade permanente de não ser, experimentar uma aventura interminável, nunca saber o que acontece ou vai acontecer. É conviver com a triste ameaça de não poder realizar sua própria utopia particular.Muitos dos problemas humanos podem até dever-se à guerra semântica que ele pratica, onde idéias semelhantes alimentam um conflito verbal interminável.Por isso mesmo, uma providencia simples, com grande alcance social e histórico, pode ser a melhoria da comunicação entre os homens.A verbalização excessiva dificulta o entendimento social. A grande facilidade de falar talvez esteja levando os homens a pensarem cada vez menos. E aprender a pensar foi a maior conquista humana, mas uma conquista que ele ainda utiliza precariamente. O prazer de pensar está sendo também dificultado pelo fascínio do homem com os utensílios e as coisas, que o grande mercado oferece. O homem deve prender-se menos ao mundo material, não abusar das palavras e preocupar-se mais com os seus semelhantes. Mas para que isso aconteça o homem precisa acostumar-se com seus fantasmas e com a própria solidão.
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