Tem o poder público direito a limitar a liberdade das pessoas de fumar, beber, em suma, de se fazerem mal, mesmo que elas queiram fumar, beber, fazer-se mal? Essa discussão reaparece sempre que uma medida legislativa coíbe o fumo ou a bebida. Vale a pena tentar esclarecer o que está em jogo.
Comecemos com uma distinção básica. Ninguém em sã consciência negará o direito – e mesmo o dever – do poder público a proibir o que faça mal a uma outra pessoa. A questão filosófica é se ele pode impedir que eu faça mal a mim mesmo. Essa distinção é fundamental porque, no debate sobre a lei seca (federal) e a lei antifumo (paulista), os dois assuntos foram constantemente confundidos.
Assim, se a lei proíbe uma pessoa com álcool no sangue de guiar, não a está impedindo de fazer mal a si mesma. Está dificultando que faça mal a outras pessoas. Essa lei, portanto, não entra no caso que estamos discutindo. Ninguém perdeu o direito de beber “até cair”, como dizia a canção de carnaval. O que não vale é guiar bêbado porque, assim, se pode ferir ou matar alguém.