Parece que a sociedade humana vive uma loucura caracterizada por uma tempestade de emoções contraditórias e multifacetadas; e ainda estamos longe de saber ou descobrir os meios de explicá-la ou de resolvê-la.Por isso eu creio que não é o cotidiano que nos cega. Para mim nós é que perdemos a capacidade de perceber esse cotidiano “alucinado” que nos envolve, onde se misturam vivências passadas com anseios futuros.
“Futuros” que viram “Passados” antes de serem apreendidos criticamente de uma forma relevante ou mais compreensiva.
Nessa fugacidade existencial tudo se fragmenta ou se esfumaça. Como conseqüência, uma cegueira social promove a busca incontrolável de renovadas crenças, outros Gurus e Xamãs, e irmãos (não carnais), mas fraternalmente solidários.
Esse fato é estimulado pelo medo e pela culpa, socialmente implantados, responsáveis pela idéia de que é utopia uma construção pessoal alternativa, que é impossível Crencarnar em qualquer pessoa um mundo existencial singular.
Assim condenado o homem oscila entre escapar (com idéias e ilusões paralisantes) ou agir irracionalmente (aderindo ao primitivismo tribal). Amedrontado por não ser, nem acreditar poder-ser, o homem foge apressadamente do si mesmo, acabando por render-se ao nada em si, afundando-se na des-identidade.
Pessoalmente creio que muitos já não “viviam” mais quando foram surpreendidos pela morte física. O retorno à experiência tribal primitiva, além de ensejar o controle de medos e a expiação de culpas torturantes, premia os neo-colonizados com a desejada (e necessária) identidade, só que sócio-tribal.
E para que esse milagre redentor ocorra basta apenas a submissão incondicional aos rituais, regras e dogmas da tribo acolhedora. E, é claro, ser aceito como novo membro do clã.
A partir desse vôo existencial regressivo todos os conflitos se resolvem e os temidos demônios são exemplarmente exorcizados.
O século XXI está sendo tido por muitos, entre os quais Michel Maffesoli, como o novo “Tempo das Tribos”.
Estaríamos assistindo outro crepúsculo da razão ou estão sendo gestadas novas razões, no mosaico de realidades em que nosso mundo se transformou?
O fato é que tudo parece relativo, que ninguém sabe mais o que está realmente acontecendo.
Mais do que nunca, a descoberta e apropriação do si mesmo tornou-se o maior mistério colocado para os humanos contemporâneos.
Ilustração - Indio Nambiquara
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