domingo, 6 de fevereiro de 2011

Finitude da vida

Alvaro Acioli
Apavoram as conseqüências e o grande preço social do extraordinário progresso material já realizado, em todos os campos do conhecimento. Multiplicam-se os radicalismos e toda sorte de fanatismos. A violência e a intolerância, de tão freqüentes, sugerem que um transporte mágico nos conduziu de volta à idade média.Qualquer observador mais atento percebe no ar certo prazer em espalhar a dor. Até parece que todos os avanços estão dominados pela intenção de institucionalizar a insensatez e as exclusões mais condenáveis. As fantásticas descobertas não estão semeando bem estar, alegria nem esperança, nos campos do mundo. Muito ao contrário, multiplicam-se os cultivos de tristeza, pessimismo, terror fóbico e da expectativa continuada de perigo iminente.Repugna constatar o desprezo com que os arautos da mitologia econômica globalizada tratam o destino da humanidade. Quanto mais os iniciados desses mitos satânicos falam em estabilidade mais sacrifícios impõem aos que já perderam quase tudo, se é que ainda possuem alguma coisa, além de um resquício de dignidade. As pessoas estão se relacionando como se a única maneira de suportar a própria infelicidade fosse impedir a felicidade dos outros. E essa prática não se acompanha de consternação nem remorso ; ao contrário, o mais freqüente, é até um estado de certa euforia. O telão planetário transmite, diariamente, no horário nobre, cenas bárbaras ou tratamentos degradantes contra seres humanos. E as cenas, de tão repetidas, acabam por se tornarem comuns, não despertando surpresa nem mesmo uma revolta discreta.Numa época de descobrimentos memoráveis o homem encontra uma clara dificuldade de entender e assumir o seu viver e ajudar os outros a também viverem. E não consegue encontrar a melhor forma de afirmar os seus sentimentos mais nobres, e a sua própria humanidade. É continuada a ação predatória sobre o ambiente ecológico. Acumulam-se resíduos tóxicos na já irrespirável atmosfera que envolve a morada dos homens. Prospera uma sociedade não somente do luxo, mas, principalmente, do lixo.O homem não consegue assumir a consciência plena de que existe de uma forma inapelavelmente solitária. E que essa contingência e a noção de limitação, que dela decorre, obrigam que ele busque irmanar-se com seus semelhantes, aprendendo a tolerar as diferenças circunstanciais.Imagino o estágio adulto como aquele no qual o desejo de seguir supera o de retroceder, quando as expressões de maturidade predominam sobre as formas regredidas e a preocupação com o nós é maior que a necessidade obstinada de afirmação do eu. É difícil antecipar o que o homem fará de si e dos seus semelhantes. São imprudentes ou ingênuas as previsões aparentemente mais lógicas. Pode-se, contudo, especular. Muitos acontecimentos irão depender de como o homem vai equacionar certos aspectos de sua vida pessoal e social, que reorientação imprimirá às estruturas e sistemas que criou. E se continuará tentado a adquirir e acumular, acima da sua capacidade de consumir.E, além de tudo, se vai chegar a perceber a finitude da vida, que seu futuro é decidido no instante, no contraditório aqui e agora.

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